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descronológico mitologia narciso

Uma das perspectivas contemporâneas do ensino da arte se propõe a partir do questionamento da linearidade enganosamente evolutiva da cronologia das produções artísticas. No lugar de um trabalho que proponha um caminho linear, que percorre a produção artística narrada pelos livros de história da arte, propõe-se que o planejamento dos professores: transpasse variados contextos, relacionando-os e confrontando-os entre si; atravesse diferentes tempos, evidenciando os encontros e fricções entre produções de outros períodos e investigue múltiplos autores, demarcando como as respostas para perguntas semelhantes podem ser complexas e variadas.


A recriação de uma linha do tempo que não seja unidirecional e evolutiva possibilita um olhar ampliado para a produção de outros tempos, além de evidenciar que as produções artísticas e imagéticas se reconfiguram a partir das leituras produzidas de maneira contextual. Assim, no lugar de uma aprendizagem voltada para a compreensão de datas e de períodos, identificam-se questões pertinentes ao momento e aos sujeitos que o compuseram, possibilitando perceber conexões com o tempo presente e desenvolver analogias anacrônicas que ressignifiquem as imagens. Ao mudar esse ponto de vista de uma aprendizagem voltada para os dados e assumir a leitura das imagens como foco central, entende-se que o ensino da arte é menos um conjunto de dados históricos, publicado nos livros e apresentado em múltiplas fontes digitais, e mais uma leitura individualizada e investigativa dos aspectos que compõem o meio artístico.


Por isso propomos o descronológico, um exercício onde sugerimos a relação entre dois tempos, a partir de conexões e desconexões entre uma obra contemporânea e uma obra de algum outro período da história da arte. Na edição de hoje conectamos Narciso, 1597-1599, de Caravaggio, com Narcissus garden, 2009, de Yayoi Kusama.


Como conexões consideramos que Narciso é um personagem da mitologia grega, filho do deus do rio Cefiso e da ninfa Liríope. Representa um ícone da vaidade, sendo representado por diferentes artistas ao longo da história. Na pintura de Caravaggio, a figura é apresentada mirando um reflexo de água, que projeta sua imagem e causa maravilhamento. A obra de Yayoi Kusama também utiliza da água, mas dessa vez contendo esferas espelhadas que convocam os fruidores a se observarem.


Em contrapartida, as duas obras se diferenciam pela linguagem, uma vez que tratamos de uma pintura e uma instalação. As obras também se desconectam na representação, que é utilizada por Caravaggio como retrato e ilustração da mitologia, enquanto na obra de Kusama a abstração é um elemento. No lugar da representação do personagem-título, a obra de Yayoi Kusama propõe que os leitores da obra que se contemplem no conjunto de esferas e no reflexo da água, propondo uma discussão da vaidade coletiva, e não mais do personagem.


Partimos desse ponto, mas e você: que outras conexões e desconexões identifica entre as duas obras?




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